As pessoas quando tornam-se mães ou pais se deparam com uma grande questão: que mundo que estamos deixando para o meu bebê viver? E aí, cada um, dentro das suas visões de mundo, da sua perspectiva e realidade, dentro das suas capacidades, vai tentando encontrar maneiras de deixar esse mundo menos hostil pras próximas gerações.
Como cada um vai agir no mundo é muito particular. E nada melhor do que usar este espaço, um espaço de escuta, de afeto e de conexão, para conhecer as histórias e jornadas dessas pessoas.
Nessa nossa quarta conexão, conversamos com a Nájila, mãe do Benjamin, de 1 ano de idade, e mãe do Semente de Ciência, um lindo projeto de educação e divulgação científica. Mas, eu vou deixar que ela mesma se apresente e conte melhor sua história.
Prepare seu chazinho, sente-se confortavelmente, porque aqui as conversas são muito boas pra serem super editadas e contadas com pressa. Então vem mergulhar com a gente nesse bate-papo!
Pra começar, me conta um pouco sobre você: quem é você, de onde veio, um pouquinho da tua história.
Eu sou uma menina do interior que foi criada pro mundo, como eu costumo dizer. Eu nasci em Alegrete (RS) e muito cedo a minha família se mudou porque o meu pai foi fazer mestrado fora. Então a gente, desde muito cedo, está acostumado a trocar de cidade, a viajar, a estar no mundo. E muito em função da pesquisa e da ciência. Então eu fui criada valorizando isso.
E hoje eu sou mãe, sou pesquisadora, sou esposa, estou casada, em um casamento heteronormativo que eu nunca imaginei na minha vida, mas tô nele. E morando em Porto Alegre, que é também uma coisa que eu nunca imaginei, nunca foi um desejo. Tem gente do interior que tem isso, que quer morar em Porto Alegre. Pra mim nunca foi uma questão. Eu estava muito bem viajando e morando no interior. Mas tô curtindo. As minhas pesquisas são voltadas pra área ambiental, então eu terminei o doutorado recentemente em sensoriamento remoto.
Eu já ouvi alguns questionamentos entre pessoas preocupadas com a questão ambiental do tipo: “o mundo já está muito cagado e tu vai colocar mais uma pessoa?” - seja pra sofrer nesse mundo que não sabemos o futuro ou seja pra ajudar a poluir. Você chegou a pensar nesse assunto?
Eu engravidei e não foi planejado. Então não pensei sobre essa questão. Mas eu sempre quis muito ter a gestação. E é uma coisa muito louca, porque eu estudo o feminismo, estudo a questão da maternidade compulsória e já me fiz a pergunta: será que eu realmente queria ou é coisa que colocaram na minha cabeça e eu tinha que querer? Mas eu tinha muito esse desejo, era instintivo mesmo.
Então, sobre a questão ecológica, de sustentabilidade, eu sempre pensava: eu tenho que acreditar nesse planeta, que ele tem que dar certo de alguma forma. Então vamos nós ajudar a melhorar a futura geração. Se eu só deixar pros outros colocarem as pessoas no mundo, como é que vai ser? Se todas as pessoas boas, feministas e “pra frente” não tiverem filhos, nas mãos de quem nós vamos deixar? Então a lógica foi sempre essa. Eu nunca pensei na maternidade como algo ruim pra ecologia ou pra sustentabilidade.
Eu tenho ainda um desejo muito forte de adotar uma criança. É um sonho desde muito cedo. E o meu esposo também tem esse sonho. Então a gente sabe que o irmão ou a irmã do Benjamin tá aí, já, vivo no mundo.
Sobre a maternidade sustentável: quais são os aspectos que tu se preocupa e que tu tenta trazer pra dentro de casa?
A sustentabilidade, pra mim, não pode ser encarada só como uma questão de proteção dos ecossistemas e do planeta. Como se a gente, o ser humano, não fosse parte do planeta. Como se fossemos alienígenas, viemos aqui e tomamos conta disso tudo, depois abandonamos e vamos embora.
Quando eu tava na graduação, era essa a visão: homem de um lado e natureza do outro. E hoje, a própria ONU, as próprias convenções do clima já estão considerando o homem como parte do sistema e parte do ecossistema. Então quando a gente pensa nisso, pra gente ter uma sustentabilidade do planeta, a gente precisa pensar em todas as esferas. A gente precisa pensar num sistema que seja economicamente viável, que seja socialmente justo e que seja ambientalmente sustentável.
Então quando a gente pensa nisso, a questão da sustentabilidade nos nossos aspectos do dia a dia fica muito mais ampla. Não é o fato de eu usar ou não o canudo de plástico. É todo um porque nós vamos usar o canudo de plástico e porque não usar outros tipos. O que nos faz usar o plástico em todos os móveis e não usar madeira ou vidro? O que que isso quer dizer?
E quando a gente traz isso pra maternidade, eu penso muito além de proibir coisas. Por exemplo, quando eu tava na gestação, eu dizia que o Benjamin não ia ter brinquedo de plástico. Mas como tu vai fazer isso? Tu vai dizer pra todas as pessoas do mundo não darem presente de plástico pro teu filho? Não! Então vamos pensar: o que é esse brinquedo, ele é realmente importante?
E desde hoje eu ofereço outros materiais. Fora os teus bichinhos, eu nunca mais comprei brinquedo pro Benjamin, ele só ganha. E o que ele mais ama é o que? Pote, folha, graveto, essas coisas. Ele dá bola pro brinquedo por 15 minutos, quando dá. Então a gente trabalha a sustentabilidade em todos os aspectos da vida dele, sabe?
Por exemplo, a gente usa fralda ecológica. Aí de noite não estava sustentável pra nossa família, socialmente sustentável, que a gente acordasse de madrugada pra trocar. Resolvemos que de noite vamos usar a descartável e vamos conversar sobre isso, vamos achar uma forma de fazer isso certo, vamos ver o que vai acontecer com esse resíduo. Vamos dentro da família discutir o que vamos fazer pra reduzir isso.
É uma mudança de chave da nossa vida. Em tudo que eu faço. Por exemplo, eu vou tomar um café com uma amiga. O que que vou fazer pra isso ser mais sustentável? Vou ir caminhando, vou pra um lugar mais próximo, vou ir num lugar que eu conheça as pessoas, que eu conheço quem fez a torta, quem fez o café, ou eu vou ir num Starbucks?
E passar esse ensinamento pros nossos filhos é só na base do exemplo. Não é sentar e conversar sobre. É no exemplo. O que vamos fazer a tardinha? Vamos no parque ou vamos no shopping? A gente tem um cachorro, como vamos tratar ele? A gente vai ter um cachorro que a gente resgatou ou que a gente comprou? O que isso significa comprar ou não um cachorro? Mesmo que esse cachorro que a gente resgatou vá virar 3x o tamanho que a gente queria!? RISOS. Acontece!
Eu acho que a maternidade sustentável não pode ser vinculada a "checks", entendeu? É visão de mundo. E não é a maternidade, é a tua vida. E é pensando em todos os aspectos! Eu não consigo mais separar.
Sim! Concordo contigo. Infelizmente a palavra sustentabilidade ficou associada com o meio ambiente, mas é um conceito complexo que envolve as questões ambientais, sociais e econômicas. E eu acho muito importante resgatarmos esse conceito e não deixá-lo ser esvaziado.
E por mais que seja muito complexo, que quando a gente começa a falar a gente vai linkando mil coisas, no dia a dia ele é muito simples porque ele não te restringe mais. O meu grande problema, por exemplo, com pessoas que são muito "ecologicamente sustentáveis" ou "ambientalmente sustentáveis" é que tem um pensamento muito restrito. Por exemplo, o veganismo: pra ser sustentável tu tem que ser vegana e Deus me livre tu usar um negócio de couro. E eu concordo que a carne é um problema e a produção de gado é um problema, mas tu restringir o uso não muda nada, não resolve o problema.
Eu sempre falo no Instagram também que não é uma ação individual que vai mudar o sistema. E assim, se a gente olhar pro passado, pra produção de gado, foi ela que fez o pampa existir. É por causa do gado que o pampa existe do jeito que existe, que as plantas que estão ali existem do jeito que existem, que os animais que vivem no meio daquelas plantas existem do jeito que existem. É por causa do gado. Ou seja, tem todo um ecossistema que é baseado no gado. Então o problema todo não é a produção de gado, é isso em larga escala. O problema é desmatar a Amazônia pra produzir gado, pra produzir carne. E não o gado livre, solto, bonitinho no pasto, permitindo outros tipos de vidas.
E eu acho que a gente precisa começar a inserir esses conceitos desde pequeno, sabe? Desde de, tipo, tem um catador de material reciclável, então vamos juntar o nosso material e entregar direto pro catador. Vamos facilitar a vida dele. E demonstrar isso e explicar pra criança porque isso tá acontecendo.
Eu, por exemplo, não acho que o Benjamin tenha que usar só roupa de algodão, que seria o mais sustentável possível. Mas as roupas que ele usa, que são compradas de grandes marcas, ele troca, eu recebo, a gente faz o rodízio acontecer pra aquilo ali ser um pouquinho mais longínquo. Não vamos conseguir mudar o sistema individualmente. Pra mudar o sistema precisa ou uma ação coletiva muito forte ou tem que vir de cima pra baixo: a partir de hoje não se produz mais monocultura e implanta uma lei, sabe?
Sim, concordo! A gente não vai deixar de fazer ações individuais, mas a gente também não pode deixar que isso nos sobrecarregue. Tem coisas muito maiores que a gente não tem poder. Tu estava falando sobre dar o exemplo, eu pensei inclusive sobre o jeito que a gente trata as pessoas, o jeito que a gente faz as escolhas. Podemos aproveitar até as perguntas capciosas das crianças, porque, do nada, a criança vem com uma pergunta do tipo: "Por que que essa criança tá na rua chorando? Por que tem um cara dormindo na calçada?"
Eu não tô pronta pra responder isso. É sério! Eu já pensei em mil respostas e na verdade eu não tenho uma resposta pro meu filho. O dia que ele se der conta que ele tem mais do que os outros... eu não tenho uma resposta pra isso. Sei lá... daqui uns anos a gente conversa de novo. Risos.
Eu acho que são essas coisas que vão mudando realmente, que vão constituindo o que a pessoa vai ser como cidadã, como agente de mudança no mundo.
Exato. Concordo plenamente. E acho importante que ele se dê conta, né? Que existem essas diferenças. Tem um aspecto que a gente pode discutir relacionado a isso, que foi a escolha da escola.
Quando eu tava grávida, eu queria muito, eu insisti muito em colocar o Benjamin em uma escola municipal, numa creche. Hoje ele não está numa escola municipal, ele está em uma escola particular. Por que essa mudança? Eu fui conhecer o sistema de escolas municipais e ele não dá conta da quantidade de crianças que tem. Então, ou eu vou lá e ocupo essa vaga, que é meu direito, que é direito do Benjamin, mas sabendo que não vai ter vaga pra todo mundo e que talvez pessoas que precisem não vão estar ganhando essa vaga ou eu procuro um meio termo pra isso.
A gente encontrou uma escola e aí outras prioridades entraram. Peguei uma escola próximo de casa, então não preciso pegar o carro pra levar ele. Peguei uma escola que se baseia no pátio da escola, se baseia no uso de árvore, não tem material, não tem plástico. E aí não peguei a escola municipal.
É importante a gente ver que a gente não vai conseguir fazer tudo, entende? A gente vai ter que tomar decisões, fazer escolhas que estão além do que está nas nossas mãos. Outros aspectos que consideramos: na escola do Benjamin tem professoras que são negras e pra mim era fundamental que existissem professoras negras na escola. Na escola do Benjamin tem colegas de mães feministas, de famílias feministas, também era fundamental pra mim. As professoras na escola do Benjamin são valorizadas e isso foi uma das perguntas que eu fiz pra diretora: como é que tá o pagamento? Como é que isso funciona? Porque isso também é importante. Então a gente tem que escolher as nossas batalhas, sabe? É muito difícil a gente querer fazer tudo do melhor jeito.
Não tem como chegar no ideal, né? Às vezes ambientalmente a melhor escolha é essa, mas economicamente isso não funciona pra mim. Só que pra ser sustentável ele tem que ser um equilíbrio entre as três áreas. Então não vai ter uma coisa perfeita, utópica que a gente vai dar conta. Tem que analisar todos os aspectos.
E é muito mais difícil na prática. Na teoria é fácil. Mas na vida real, todos os dias são escolhas diferentes e são escolhas cansativas. Tem dias que tu não quer escolher mais nada! Teve um dia que eu tava tão cansada, e nessa época a gente usava só fralda de pano, que eu disse pro Tiago: "pelo amor de Deus, vai na farmácia e compra qualquer coisa que tu enxergar de plástico que eu vou meter nessa criança". Porque tem horas que não dá conta. No fim, eu usei um pacote de fralda e doei o resto.
Pra quem tem não filho, acho que seria mais ou menos como: o ideal é cozinhar em casa, o ideal é ter tua hortinha e tu cozinha e põe os temperos mais deliciosos. Mas na hora que a fome bate, se tu não tem nada em casa, tu liga pro delivery ou tira um congelado. Então vai ter dias que vai ter que ser delivery, vai ter dias que vai ter que ser congelado.
Às vezes eu brinco: eu queria ser ignorante de vez em quando. Como eu queria não saber de todas essas coisas e fazer uma escolha ruim. Uma escolha que eu sei que é ruim, mas que é mais fácil, que é mais prática. Porque a gente se culpa muitas vezes e é muito difícil se consolar com essa ideia de que é o que dá agora.
E é muito difícil. Acho que esse post deve se chamar "é difícil". Risos.
Aproveitando essa questão das escolhas. Tu fez a festinha de aniversário do Benjamin. Eu já tive a experiência de acompanhar uma amiga que estava tentando fazer uma festa com o mínimo possível de plástico e foi muito complexo. Como foi essa experiência pra você?
Primeiro, a festa do Benjamin foi uma decisão tomada um mês antes. Eu tinha decidido não fazer festa: COVID tá aí, pandemia, não tem dinheiro, não tô afim de gastar com isso. A gente tinha planejado, na gravidez, que o aniversário de um ano do Benjamin a gente ia passar viajando. E aí por causa da COVID não aconteceu e eu tava desolada. Então se não vou viajar, não vai ter festa também. Risos. Depois da euforia, minha mãe disse pra gente fazer só um cachorro-quente pra família.
Aí eu resolvi fazer alguma coisa que fosse do meu jeito. De plástico foi muito pouco porque a gente tinha o salão do condomínio, que era uma salão onde não se usa plástico. A decoração a gente fez toda com a natureza. A gente saiu catando folhas bonitas, plantinhas que a gente tinha em casa e da minha família. Os docinhos e os salgadinhos a gente encomendou de uma amiga. A torta foi dessa cafeteria aqui. Foi tudo muito simples, só pra umas 15 pessoas: a família e os padrinhos. Além das plantas, decoramos com os brinquedos dele, os amigurumis.
Quando eu tava grávida, a minha irmã nos deu de presente um livro que se chama "Floresta da Amizade". Este livro conta a nossa história, minha e dos meus dois irmãos. Quando a gente veio pra Porto Alegre, foi mais ou menos na mesma época e foi uma fase que a gente teve que se ajudar muito, moramos juntos, foi uma confusão. E ela fez uma história falando um pouquinho sobre isso e nela cada um de nós é um animal.
A nossa decoração foi baseada nesse livro. E como foi uma história muito querida, o Benjamin tinha os personagens, porque a gente já tinha mandado fazer os bichinhos. Então, também pensando em sustentabilidade, além de não usar plástico, a festa foi baseada no significado daquela história, sabe?
A gente também evitou comilanças e a festa foi mais minimalista. E usamos a floresta. Gente, sério. A natureza é linda, usem de decoração!!
Essa questão de usar a natureza na decoração me lembrou a personagem Anne de Green Gables. Estou lendo a coletânea de livros e ela tem uma conexão linda com a natureza, uma adoração!
A gente precisa ter esse contato mais próximo com a natureza. Isso vai desde a nossa casa, de ter mais plantas, mesmo que a gente mate de vez em quando... acontece, gente! Elas também não vão viver pra sempre! Risos. Acho que faz muito bem pra todo mundo que vive na casa.
E acho que também devemos ocupar mais os espaços da nossa cidade, os espaços públicos. Fazer com que eles sejam nossos e aí sim, se transformem. Por exemplo, a pracinha que tem aqui perto. Logo que a gente veio pra cá, essa pracinha era super escura, era um negócio horrível. E ela tem um beco que vai sair na outra rua e nós morríamos de medo de passar ali. Aos poucos, a comunidade foi usando, fui percebendo mais o movimento das crianças. Aí eu não sei se foi uma empresa, quem foi, que arrumou a pracinha. As crianças foram usando e hoje ela tá super iluminada. Hoje se tu for a qualquer horário da noite, é super tranquilo. Tá limpa, tá bem arrumada, tá sendo usada. E é uma pracinha pequena. Sem falar nos grandes parques.
As pessoas tem um grande problema de achar que público não é de ninguém. E é ao contrário, público é de todo mundo. E se é de todo mundo, tu tem o dever de cuidar daquilo. Jogar papel no chão é horrível, não faça isso, mas se tu ver um papel no chão, tu pode recolher. Por mais que tu saiba que a pessoa que jogou não deveria ter feito aquilo. Não o contrário: se já tá sujo, eu vou lá sujar mais, sabe?
Isso vai de encontro com o que falávamos de maternidade. Acho que o Benjamin foi no shopping 2 ou 3 vezes na vida dele. Ele não vai em shopping, ele nem gosta. Agora põe o guri no parque pra tu ver!? Ele fica o dia inteiro! E as pessoas dizem que tem que levar mil brinquedos. Não, a natureza é o melhor brinquedo! Eu posso levar 10 brinquedos pro Benjamin, mas ele vai usar o pauzinho que ele achou no meio da grama. Porque é isso, eles gostam das texturas diferentes, eles gostam de sentir a terra, de sentir a areia.
Se já anda, aí pronto! O negócio é sair correndo enlouquecido: Liberdade! Liberdade!
E ele começou a andar no dia do aniversário dele, tu acredita? No dia do aniversário dele. Então ele tá nessa fase agora. Tenho até medo de soltar. Porque enquanto engatinha, tem um raio, um limite. Mas ele gosta muito e a gente tenta deixar ele o mais livre possível.
Eu queria saber se você tem outras mães, amigas, com quem você consegue trocar ideias ou se você se sente meio sozinha, isolada.
Logo que eu engravidei, eu entrei num grupo de mães que usam fraldas ecológicas e se ajudam. Só que eu saí do grupo porque era muito restrito: se tu não fizer tudo perfeitamente, tu tá errada. E às vezes a pessoa só quer um aval pra de vez em quando não usar a fralda ecológica. Então eu cansei um pouco. Eu consigo discutir mais com amigas que são da área ambiental, sabe?
Na pandemia também surgiu um grupo de amigas porque seguiam a Mirelle (@13anosdepois). E aí era mais gostoso de conversar sobre isso porque não tinham só mães, tinham outras realidades, e eu acho que tava todo mundo numa fase de tentar aceitar suas vulnerabilidades. Então grupo de mães eu não tenho, mas eu tenho essas amigas que surgiram a partir desses encontros.
Quais são os valores que tu se preocupa em passar pro Benjamin?
O Benjamin é filho de pai negro, ele tem toda uma descendência negra. Eu tenho avós negros também, mas pra mim tá mais longe e pro Benjamin é mais direto. Então eu acho que um dos principais valores que a gente tenta passar pra ele, além de respeito e tal, é o de liberdade. Que ele defenda a liberdade dele independente de qualquer coisa. Que ele seja livre pra fazer o que ele bem entender.
E isso a gente faz desde hoje. Ele tem que ser livre pra brincar. Às vezes quando eu vejo alguém segurando ele de alguma forma, eu digo "não, ele não quer". A pessoa quer que ele venha no colo, mas ele não quer. Busco preservar a liberdade dele. Se ele não tá afim, não tá afim. E eu dizia, na festinha: “Já vou avisar, se ele não quiser, ele não vai ficar na festa dele. Vocês vão ficar lá sozinhos.” Porque eu tinha muito claro que se ele não quisesse, se ele se incomodasse ali, ele não ia ficar.
No fim o guri adorou, né? Sério. Te juro. Eu não consegui ver o Benjamin. Ele ficou zoando a festa inteira. Ele só me procurou quando ele tava fome. Parece que já tem 15 anos, né? Mas não, ele só tem um. Ele ficava engatinhando de um lado pro outro, aí meio que caminhando, meio engatinhando. De um lado pro outro.
Claro que a gente fez um ambiente que ele conhecia todo mundo, ele tava seguro naquele ambiente. Como foi a gente que fez tudo, então ele ficou lá desde o início e acho que isso fez ele se adaptar ao espaço. E também a gente fez muito curta a festa. Isso eu esqueci de te dizer. A gente começou às 16h e lá pelas 18h30, eu já tava perguntando se todo mundo tinha comido, se estavam bem. E aí, lá pelas 20h já tava todo mundo em casa dormindo. Pra preservar ele. E preservar essa liberdade de que é ele que sabe.
Bom, e pra finalizar a nossa conversa, eu sei que tu é muito ativa na internet, até pelo teu trabalho. Tu utiliza a internet e as redes socias pra buscar informações e referências sobre maternidade?
Sim. Na gestação mais. A gente tem a ilusão que durante a maternidade a gente vai conseguir estudar muito. A gente não vai conseguir. Risos.
Na gestação eu fiz um curso da Dra. Jannuzzi. Eu recomendo muito o perfil dela. É um perfil muito real. Ela é mãe, é médica, pediatra e obstetra, e ela tem um curso que é sobre sono e rotina. Porque uma das coisas que mais me incomodava da gestação era ouvir dizer que nunca mais ia dormir. E eu sou muito dorminhoca. Eu dizia: “Não é possível que eu não vá dormir! O que que eu vou fazer da minha vida?” E aí eu fiz o curso dela e a sigo até hoje.
É um curso muito completo que me ajudou a entender as fases. Hoje eu consigo observar e entender o que que tá acontecendo com o Benjamin. Por exemplo, ele começou a andar. Uns dias antes de começar a andar até agora a pouco, ele não dormia mais de noite. Ele só dormia grudado na gente, juntinho. Era o único jeito dele dormir. E eu dizia: “vai passar porque é só uma fase, que é porque ele começou a caminhar”. Entender isso pra quem não é mãe e pra quem nunca leu sobre, eu acho muito importante.
Na época da gestação eu comecei a acompanhar muita gente sobre fraldas ecológicas, sobre maternidade mais sustentável. Acompanhei muita gente, mas hoje eu já tô começando a deixar de seguir, porque dei uma cansada.
Pra além de rotina e sono, tu estudou mais coisas na gestação?
Eu estudei alimentação, porque pra mim era muito que o Benjamin comesse bem desde o início. Acho que é a pior coisa pra mim porque o Benjamin não come. Ele experimenta, às vezes ele come mais, às vezes não... e aí na escola ele come tudo! Eu juro pra você!
Então eu lembro que era o parto - estudem sobre parto -, a questão das fraldas ecológicas, sono e rotina - e isso envolve um monte de coisa, inclusive sobre saltos de desenvolvimento, sobre as diferentes fases -, alimentação e escola. Escola também foi uma coisa que eu estudei porque eu tinha uma dúvida assim: como que se escolhe uma escola? Porque assim, uma criança de 6 meses, que é a fase que eu comecei a procurar, não vai dizer "essa eu gostei", "ah, essa não", "essa professora eu não fui com a cara", ela não vai dizer isso.
Então eu fui pesquisar como escolher, quais fatores. E aí tu tem que colocar no papel o que pra ti é importante, porque não existe escola perfeita. No meu caso, era muito importante que fosse uma escola que não tivesse cadeirinha de descanso. Eu acho que dentro duma escola, que a gente está pensando no desenvolvimento, eu não acho que deveria ter essas cadeirinhas porque acho que abre brecha pra deixar a criança a tarde toda ali, sabe? E curiosamente sempre tinha uma criança na cadeirinha das escolas que a gente visitou. Sabe liberdade? Então, o Benjamin precisava ser livre pra escolher sentar ou não.
Tinha que ser perto de casa e tinha que aceitar fralda ecológica, que tem muitas escolas que não aceitam. E ainda tive que ouvir que não era higiênico! Sendo que não faz diferença nenhuma. Ou tu coloca a fralda dentro de um saco de plástico que tu vai botar na rua, ou tu coloca dentro de um saco retornável que a mãe vai levar embora no final do dia. Qual é a diferença?
Então pra nós foi encontrar uma escola que aceitasse e que deixasse ele livre. Então nem era muita coisa, poxa.
Nem eram tantos requisitos assim. Risos. Foi difícil?
Foi, ou não. Risos. Na verdade foi muito fácil porque a escola que a gente escolheu foi a primeira que a gente visitou, que era na rua de casa. Mas como eu não acreditei, porque quando a esmola é muita, o santo desconfia, resolvemos procurar mais. Acho que eu visitei mais umas 5 e aí eu disse “volta!” Porque é super restrito de vagas, né? Eu lembro que eu mandei mensagem na hora pra diretora dessa escola e disse: "Pelo amor de Deus, tu não usou a vaga do Benjamin ainda, né? Segura que eu tô voltando!" Mas foi difícil encontrar uma que se encaixasse.
Fico tão feliz que você tenha acompanhado todo o nosso papo!
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